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Procuradoria Geral do Município / Solução

02 de Maio de 2016 20h50

Mauro Mendes decreta intervenção na CAB Cuiabá por 180 dias

CARLOS MARTINS

Marcos Vergueiro

Arquivo

Graves irregularidades detectadas pela Comissão Especial de Auditoria que apurou a situação da CAB Cuiabá, e atendendo a recomendação da Arsec (Agência Municipal de Regulação de Serviços Públicos Delegados de Cuiabá), levaram o prefeito Mauro Mendes a decretar na tarde desta segunda-feira (02), a intervenção na concessionária que tem a concessão do abastecimento de água e tratamento de esgoto em Cuiabá. O prazo de intervenção é de 180 dias, prorrogáveis.

A intervenção, formalizada pelo Decreto nº 6.009, é amparada pela Lei Federal nº 8.987/95, segundo a qual o “Poder Concedente pode intervir na concessão para assegurar a adequação na prestação do serviço, bem como o fiel cumprimento das normas contratuais, regulamentares e legais pertinentes”.

Nesta terça-feira a Câmara Municipal vai votar em regime de urgência-urgentíssima projeto enviado pelo prefeito, autorizando a intervenção, de acordo com o que estabelece a cláusula 37.2 do contrato de concessão. Para o cargo de interventor foi nomeado Marcelo de Oliveira, que deixa nesta terça-feira o cargo de secretário de Obras Públicas. Além de acessar documentos que foram sonegados durante o trabalho da comissão, Oliveira irá adotar uma série de medidas para reestabelecer a normalidade nos serviços.

A decisão do prefeito foi anunciada durante a entrega do relatório de 70 páginas elaborado pela comissão que foi criada pelo Decreto nº 5.923 assinado em dezembro passado por Mauro Mendes. Pelo que foi apurado durante o trabalho, presidido pelo procurador-geral do Município, Rogério Gallo, além das dificuldades criadas pela situação do controlador, o Grupo Galvão Engenharia, que pediu recuperação judicial, a comissão concluiu que houve gestão temerária e existem claros indícios de desvio de recursos da concessão.

“O que estamos fazendo é adotar medidas para retomar a execução deste contrato. Nesses 180 dias existem duas portas de saída: a primeira é que o grupo que detém a concessão venda a CAB Cuiabá para outro investidor, com a autorização do Poder Concedente, e que venha a cumprir com as metas estabelecidas em contrato. Este é o melhor caminho. Se isso não ocorrer, ao longo desse período teremos acesso aos documentos que eles nos dificultaram e implementaremos o plano de ação que será executado neste prazo. Acreditamos que isso será possível fazer com o próprio dinheiro gerado pela companhia. E ao final do prazo, se não houver comprador, poderá resultar na caducidade do contrato pelo não cumprimento das metas do contrato”, explicou Mauro Mendes.

O relatório da Comissão foi divulgado em conjunto com a apresentação por parte da Arsec de uma nota técnica e também de uma deliberação, recomendando a intervenção. A Comissão Especial de Auditoria foi formada também pelos seguintes integrantes: Rosidelma Francisca Guimarães Santos (representante da Arsec); Marcelo Bussiki Rondon (Controlador-Geral do Município); e Francisco Serafim de Barros (Secretário-adjunto de Tesouro da Secretaria Municipal de Fazenda). Também esteve presente o diretor-presidente da Arsec, Alexandre Busatamente, acompanhado de diretores.

“Adotamos nesse período toda a cautela, tratando o assunto com muita responsabilidade. Embora questionados, não agimos para criar medidas espetaculosas, jogando para a galera. Sabemos o que está em jogo”, acrescentou Mauro Mendes, durante a apresentação do relatório em coletiva à imprensa, que teve também a presença de secretários e do presidente da Câmara, Júlio Pinheiro, que estava acompanhado de vários vereadores. “Esta medida vem ao encontro daquilo que a Câmara também quer. Amanhã mesmo vamos apreciar o projeto e aprovar por unanimidade”, garantiu o presidente.

Confusão patrimonial

De acordo com o presidente da Comissão Especial, Rogério Gallo, a auditoria mostrou que o trabalho da CAB não foi executado a contento não apenas pelas dificuldades enfrentadas por sua controladora, mas também porque a gestão foi inadequada do ponto de vista da governança corporativa. “Havia uma confusão patrimonial, financeira e operacional. Foi detectado que o principal contrato firmado pela CAB Cuiabá em dezembro de 2012 foi com a própria Galvão Engenharia, sua controladora, no valor de R$ 492 milhões por cinco anos sem qualquer autorização da agência reguladora, dos quais já foram pagos R$ 96 milhões”, destacou Gallo.

Para o procurador-geral, este fato causou muita surpresa, já que o envolvimento das empresas – controlada e controladora - poderia falsear os resultados. “É como numa relação de pai e filho. O controle fica muito menor, pode ter desvios”, disse Rogério Gallo. Causou espanto durante a auditoria constatar que o contrato no valor de R$ 492 milhões foi assinado no dia 19 de dezembro de 2012 e sete dias depois ocorreu à emissão de uma nota fiscal no valor de R$ 34 milhões. “É impossível fazer em sete dias um serviço nesse montante. Pedimos as medições para saber quais foram os serviços realizados e depois de muita dificuldade recebemos documentos que não foram suficientes para provar que as medições ou serviços foram realmente executados”, revelou.

O relatório apontou 11 indícios de irregularidades, dentre eles, o pagamento de salários altíssimos para a diretoria, bem como prêmios que chegaram a R$ 2 milhões entre 2013 e 2015. Em 2014, por exemplo, o diretor-presidente recebeu, em média, um salário mensal de R$ 150 mil. “Este valor é fora da realidade e não foi demonstrado nenhum plano a esse respeito. Inclusive houve resistência em entregar informações sob a alegação de que fazia parte de informações do Grupo Galvão. Enquanto o serviço degringolava, se gastou o dinheiro da concessão em benefícios, fora das regras da concessão, em desacordo com as normas”, afirmou.

A auditoria descobriu, também, a assinatura de um contrato firmado entre a CAB Cuiabá e a CAB Ambiental, sua controladora, no valor mensal de R$ 435 mil. “É um contrato que pode ser chamado de vitalício, pois o prazo é de 30 anos, o tempo da concessão. É m contrato para prestar assistência técnica à CAB Cuiabá de difícil mensuração de seus resultados e que podem ser falseados, trazendo prejuízos para todos nós que pagamos as tarifas de água. São evidências de possíveis indícios de fraude”, destacou o presidente Comissão Especial.

Outro indício de irregularidade apontada foi no contrato firmado com a empresa W. A. da Silva Service, no valor de R$ 2 milhões para prestar serviços de conservação de área verde. Conforme diligências feitas pela comissão, a empresa estaria localizada em Várzea Grande, mas no local apontado (constante nas notas fiscais), está instalada em uma casa de festas. O CNPJ da referida empresa, tem como localização um bar, localizado no Bairro Bela Vista, em Cuiabá. “Pedimos também as medições e não obtivemos as evidências necessárias que os serviços foram prestados. São sinais de irregularidades que envolvem uma empresa provavelmente fictícia”, afirmou.

Empréstimos

Quando assinou o contrato de concessão em 17 de fevereiro de 2012 (com entrada em vigor em 1º de maio de 2012), a CAB Cuiabá garantiu que os recursos utilizados para o pagamento da outorga, no valor de R% 115 milhões, eram próprios. Só que a auditoria descobriu, ao analisar documentos, que a concessionária tomou empréstimos da própria CAB Ambiental. Em 2012, a concessionária levantou também um empréstimo do Banco Votorantim no valor de R$ 170 milhões para pagamento em seis meses. “A CAB Cuiabá entrou numa ciranda financeira. Um papagaio cobriu o outro. A partir daí, ela não conseguiu mais se estruturar financeiramente”, afirmou o procurador-geral.

O resultado desse aperto financeiro, é que nesses anos a CAB Cuiabá pagou cerca de R$ 138 milhões em despesas financeiras. “Nestes três anos e meio de concessão, a CAB Cuiabá tomou de empréstimo da CAB Ambiental o valor de R$ 152 milhões e remunerou sua controladora nesse período pagando juros de 120% do CDI. Hoje, no máximo, se paga 70% do CDI. Isso caracteriza a prática de usura, que beneficiou indevidamente a CAB Ambiental, e que será devidamente apurado e o valor deverá ser restituído”, afirmou.

Ao concluir a exposição, Rogério Gallo garantiu que a empresa tornou-se, hoje, inviável, já que fechou 2015 com um endividamento de 100,58%. “Isso significa que para cada real que tem, ela deve um real. A empresa não tem capacidade para tomar empréstimo no mercado, que admite, no máximo, um endividamento de 70%. A gestão começou errada e não poderia, em quatro anos, ter outro resultado se não o que vimos hoje”, finalizou.

Conhecedor do sistema

Ao nomear o interventor, o prefeito Mauro Mendes disse que Marcelo de Oliveira possui experiência suficiente para conduzir o trabalho. “Já foi presidente da Sanecap e é um profundo conhecedor do sistema”, afirmou. Com Marcelo de Oliveira no comando, os diretores da CAB serão destituídos dos seus cargos e terão suspensos seus contratos de trabalho. 

Conforme o decreto assinado pelo prefeito, a intervenção tem o objetivo de “assegurar a continuidade do serviço de abastecimento de água mediante a apresentação de plano emergencial para implantação de Estação de Tratamento de Água, reservatórios e adutoras para melhorar progressivamente os indicadores de reservação e de qualidade da água”, itens que não foram cumpridos pela CAB Cuiabá, conforme relatórios apontados pela Arsec.

O interventor terá plenos poderes para realizar auditoria na concessionária para apurar em todos os contratos os pagamentos feitos e se os recursos arrecadados estão sendo corretamente empregados em fins da concessão. Poderá, também, suspender todo e qualquer pagamento da concessionária para partes relacionados (empresas pertencentes ao grupo); também fornecerá todas as informações solicitadas pela Arsec e também pela Comissão Especial de Auditoria, que continuará atuando nesse período.

 

RELATÓRIO DA COMISSÃO  

 

DECRETO DE INTERVENÇÃO

 

NOTA TÉCNICA DA ARSEC

 

DELIBERAÇÃO DA ARSEC